sábado, 14 de fevereiro de 2009

Quase

"Ainda pior que a convicção do não e a incerteza do talvez é a desilusão de um quase.
É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi. Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem quase morreu está vivo, quem quase amou não amou. Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas idéias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono.
Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados. Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza. O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.
Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance; para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos somente paciência porém, preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer. Pros erros há perdão; pros fracassos, chance; pros amores impossíveis, tempo. De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance. Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar. Desconfie do destino e acredite em você. Gaste mais horas realizando que sonhando, fazendo que lanejando, vivendo que esperando porque, embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu."

Luis Fernando Veríssimo

Este texto é para mim, sem a menor dúvida, a melhor descrição da realidade que está todos os dias perante os meus olhos... Em cada frase deste texto encaixa tudo aquilo com o que contacto e por isso não me canço de o ler, reler e voltar a ler. E sempre que o leio, tal como Veríssimo, também contesto. Quere-me parecer que hoje em dia as pessoas não sabem viver. Ou então não querem viver. Não sei. Também nunca me lembrei de perguntar... Viver a vida em toda a sua plenitude não é o mesmo que existir, nem sinónimo de festas, paixões passageiras, status, imagem, e tudo o resto que daí advém... Creio que é muito mais do que isso: é frescura, sorrisos verdadeiros, sinceridade, amizade, paixões verdadeiras e confiantes, felicidade...E parece-me que é muito disto que falta a muitas pessoas: "sobra cobardia e coragem até para ser feliz". Actualmente vive-se para uma imagem, para uma carreira, para um status, para aquilo que os outros vivem e querem que nós vivamos também; vive-se para tudo menos para nós. Confesso que por vezes fico tentada a seguir esse caminho, "tornar-me eles e não eu", quando quase todos à minha volta são assim, mas resisto porque sei que esse estilo de vida não me acrescenta nada nem completa. Acho que no fundo as pessoas têm medo em se afirmar e vivem a tal vida morna, tal como as algas que vão e vêm ao sabor das ondas do mar. Não conseguem ser autênticas, nem assumir compromissos. Sentem uma insatisfação com a qual não conseguem lidar e andam sempre à procura de algo que não sabem bem o que é. Vivem sempre no abismo entre aquilo que querem e aquilo que acham que deviam querer e vão tropeçando constantemente nos outros à sua volta até chegarem onde querem...ou pensam que querem. Ninguém consegue ser feliz assim. E por isso contesto.

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